domingo, 14 de setembro de 2008

Distante, mas não muito.

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Da esquerda pra direita: Ely, Borjão, Mauro, Jajá e Ademir.

Após a derrota de 4x1 para El Salvador, começaram a surgir dúvidas sobre a seleção brasileira.

Em 1948, o Chile era considerado uma potência do futebol e sem demora o povo pôs a culpa pelos maus resultados no dinheiro vindo dos Andes. Com a aproximação da Copa América, os jornais pediam o afastamento do técnico Flávio Costa. Os dirigentes não acataram.

No Rio, a um mês da estréia, era possível ver o pessimismo estampado na cara de cada cidadão que caminhava pelo Leblon. A seleção tinha mudado pouco desde a derrota para El Salvador. Tendo o Brasil como sede, o que preocupava era o vexame em nossa própria casa, diante da nossa torcida. Os ânimos se exaltaram tanto que o presidente José Linhares, torcedor fanático do Ferroviário, resolveu interferir: ou o time mudava, ou ele proibiria que o evento acontecesse em terras tupiniquins.

No dia 17 de março de 1949, Flávio Costa convocou o centroavante Borjão, um completo desconhecido. Meia hora após o anúncio um frenesi tomou conta das rádios. As pessoas não acreditavam que aquilo poderia estar acontecendo. Onde já se viu um jogador sair direto dos campos de várzea do Bangu para uma Copa América?

A decisão estava tomada e o prazo de inscrição havia terminado. Borjão, centroavante de futebol gracioso, como se referiam seus adversários de várzea, representaria o povo. Nas entrevistas seu tom assustado não deixava dúvida, nem ele sabia o que estava fazendo ali. O próprio jogador admitia que não via a hora daquilo tudo acabar, não queria deixar o pessoal do futebol de sábado na mão.

Não demorou até o dia da estréia contra o Equador. Quem foi ao São Januário no dia 3 de abril viu a equipe adversária abrindo o marcador aos 21 minutos do primeiro tempo. O jogo era ruim pra seleção canarinho e foi aí que Costa chamou Borjão, o representante do povo. Sem nenhum ritual e com a camisa 14, o centroavante varzeano de 1 metro e 72 centímetros entrou em campo. Logo aos 24 minutos, deu um toque de classe para que Jair empatasse para o Brasil. Com sua objetividade Borjão cativou a torcida e não demorou para que a seleção ampliasse o marcador. Embora não possuísse o cacoete de finalizador, naquele dia ele descobriu uma afinidade imensa com Jajá, que marcou sete dos nove gols. Brasil 9, Equador 1.

Os cariocas ficaram atônitos. Ninguém nunca imaginaria que uma loucura com essa poderia funcionar. O presidente aproveitou o fato para se promover, para ele o centroavante era o exemplo do brasileiro comum. Linhares acreditava que cada trabalhador tinha um pouco de Borjão dentro de si. E isso iria mudar o país.

Os dias que seguiram foram de espetáculo. Com Borjão a seleção encantava e foi assim até a final, uma goleada de 7 a 0 em cima do Paraguai, em um jogo disputado no campo do Vasco da Gama. O jogo também marcou o fim da parceria entre uma das melhores duplas de ataque que o país já viu. Tudo isso porque Borjão, o representante do povo brasileiro, abandonaria o futebol para continuar sua vida de atendente no secos e molhados do seu tio.

2 comentários:

Guilherme Becker disse...

Belíssima estória. O lance do trabalhador-brasileiro-comum-que-joga-futebol-no-esforço-e-cativa-a-todos é antigo pra caralho, definitivamente. Grande Borjão! Dá-lhe Borjão!

Marlon Abrahão disse...

Fez um Borges.


Do caralho.